Depois de dez anos de
revolução na França, especialmente a burguesia, que desejava usufruir do espaço
político que havia conquistado, estava ansiosa por medidas capazes de recuperar
a economia e restabelecer a ordem social. Com o Golpe de 18 de Brumário, Napoleão
Bonaparte, figura de grande prestígio entre os militares e identificado com os
ideais dos burgueses, pôs fim ao ciclo revolucionário e deu início a um período
em que as conquistas alcançadas durante a revolução foram consolidadas e
expandidas pela Europa. Durante quinze
anos ele governaria a França de forma ditatorial, obtendo, de forma curiosa, o
poder absoluto e estabelecendo o domínio francês sobre boa parte da Europa. A
chamada Era Napoleônica pode ser dividida em três fases: o consulado (1799 –
1804), o império (1804 – 1815) e o governo dos cem dias.
CONSULADO (1799 – 1804)
Com o Golpe de 18 de Brumário
que pôs fim ao processo revolucionário na França, o governo do Diretório foi
substituído por um grupo de três cônsules que teriam o compromisso de elaborar
uma nova constituição. A França permaneceria sendo uma república, porém
governada por militares com poderes centralizados. Entre os cônsules estava o
general Napoleão Bonaparte, de grande destaque na defesa dos ideais revolucionários
e muito prestigiado pela população. Para boa parte da alta burguesia, Napoleão
era o nome ideal para conter a insatisfação de setores mais radicais e devolver
ao país a harmonia política e prosperidade econômica.
A constituição previa que
Napoleão seria por um período de dez anos o primeiro-cônsul da França.
Entretanto, apenas três anos depois, o general foi aclamado cônsul
vitalício[1]
garantindo o direito de indicar seu sucessor. Assim, apesar de compartilhar o
poder com outros dois cônsules, o general passou a concentrar todo o poder em
suas mãos reforçando sua imagem de defensor da ordem e da paz. Mesmo sendo autoritário, Napoleão
devolveu aos franceses o orgulho perdido e passou a recuperar rapidamente a
economia. O próprio Napoleão nomeava os membros da administração, propunha as
leis e conduzia a política externa.
As principais medidas tomadas por
Napoleão
Com o objetivo de recuperar a economia, Napoleão, no ano de 1800,
promoveu a criação
do Banco da França que passou a ter a responsabilidade de controlar
a emissão de dinheiro e de combater a inflação.
O governo passou a proteger a indústria e o comércio estabelecendo taxas sobre os
produtos importados e promoveu a execução de grandes obras públicas.
Essas medidas provocaram a redução do desemprego. A alta burguesia se
consolidou como grupo dominante e para garantir
o apoio dos setores mais populares, Napoleão garantiu a redução do preço do pão e a distribuição de
terras aos camponeses. Os ideais de liberdade, igualdade e
fraternidade, muito divulgados e defendidos no tempo da revolução, foram sendo
reprimidos por meio de uma severa censura à imprensa.
Com o objetivo de formar cidadãos capacitados para servir o Estado,
Napoleão promoveu uma grande reforma na educação, permitindo melhores oportunidades a baixa burguesia. A
relação entre a Igreja e o Estado foi reatada através do acordo assinado em
1801 e que ficou conhecido como Concordata. O papa reconhecia o confisco das
terras da igreja pelo Estado, que, por sua vez, se comprometia a proteger o
clero.
Nos anos de consulado, o próprio Napoleão comandou várias vitórias do exército
francês sobre os demais países do continente europeu obtendo assim grande
popularidade. As vitórias alcançadas contra inimigos externos, mais o sucesso
das medidas tomadas pelo governo deram ao povo francês um novo ânimo. Depois de
longos anos de instabilidade política e econômica o país finalmente parecia
estar entrando em um novo momento.
Ainda
durante o consulado foi criado um novo código de civil. Contendo leis que
defendiam a liberdade individual, a igualdade de todos perante a lei e o respeito
à propriedade privada. O Código Civil Napoleônico,
como ficou conhecido, assegurava as conquistas da burguesia alcançadas durante
a revolução, porém, ao mesmo tempo, proibia a organização de trabalhadores e as
greves.
Napoleão aproveitou-se muito bem do prestígio que alcançou junto ao
povo e apoiado pelas elites socioeconômicas passou a defender a implantação
definitiva do império. Em 1804 foi realizado um plebiscito onde quase 60% dos
votantes optaram pelo fim da república e pelo retorno do regime monárquico.[2] No
início de dezembro de 1804 Napoleão foi coroado imperador da França. [3]
IMPÉRIO (1804 - 1815)
O governo imperial de Napoleão Bonaparte foi marcado pelo seu
autoritarismo, e lembrou, em certos momentos, a monarquia absolutista derrubada
pelos revolucionários anos antes. A grande diferença é existência de uma
Constituição e a presença de uma Assembleia. Como imperador, Napoleão conferiu
títulos de nobreza a seus familiares. Os cargos públicos mais importantes
passaram a ser ocupados por membros da alta burguesia e da antiga nobreza. Para demonstrar o poder do império, grandes
monumentos foram construídos, como, por exemplo, o Arco
do Triunfo.
Napoleão tinha dois grandes objetivos: restabelecer as relações com os
demais países europeus e fazer da França uma grande potência industrial. Apesar
de Napoleão ter conseguido durante o consulado manter uma boa relação com os
países vizinhos e de ter estabelecido um clima de cordialidade, anulando
inclusive as decisões consideradas mais radicais, sua coroação como imperador
causou temor entre os governantes das principais potências da Europa. Em 1805, liderada
pela Inglaterra, as principais monarquias europeias organizaram uma coligação
para enfrentar os exércitos franceses.[4] Para
enfrentar esses inimigos externos e atingir seus objetivos, Napoleão,
aproveitando o melhor momento econômico do país, passou a realizar grandes investimentos nas forças armadas.
EXPANSÃO MILITAR
Com um exército reforçado e praticamente imbatível, Napoleão tratou de
expandir os domínios franceses pela Europa. Na luta para fazer da França a
principal potência do continente, o principal adversário de Napoleão era sem
dúvida alguma a Inglaterra. A rivalidade entre esses dois países se devia a
dois motivos: disputa por mercados consumidores de produtos industrializados e
o fato de a Inglaterra ter liderado, e ainda liderar as alianças que eram
contrárias ás ideias revolucionarias.
Em 1805, procurando destruir sua principal rival e assim ter o caminho
livre para controlar toda a Europa, Napoleão tomou a iniciativa de atacar sua
principal rival, sem considerar, contudo, a força da marinha de guerra dos
ingleses. Na Batalha de Trafalgar,
ocorrida no dia 21 de outubro de 1805, os franceses sofreram pesada derrota ao
tentarem invadir a Inglaterra. Após essa derrota, os franceses foram obtendo
seguidas vitórias terrestres sobre seus adversários e passaram a dominar boa
parte da Europa. Na medida em que os territórios eram conquistados, Napoleão
substituía os monarcas derrotados por parentes e amigos, responsáveis por
realizar reformas políticas liberais. Apesar dessa recuperação e de seu
exército ser temido em toda a Europa, Napoleão admitia que era impossível
atacar e vencer a Inglaterra, protegida pelo mar e por uma poderosa Marinha de
Guerra. Sem condições de derrotar os ingleses no campo militar, o imperador
tentou vencer seu principal inimigo no campo econômico decretando, em 1806, o Bloqueio Continental. Pelo
bloqueio, todos os países da Europa estavam proibidos de realizar comércio
(compra e venda) com a Inglaterra e deveriam fechar seus portos aos navios
ingleses. Aqueles que não respeitassem o decreto teriam seus territórios
invadidos pelas tropas de Napoleão. A medida visava logicamente enfraquecer a
economia inglesa e ao mesmo tempo e indiretamente fortalecer a economia
francesa já que a ideia também era substituir a Inglaterra no mercado do
continente atendendo as necessidades dos outros países.
O efeito do
decreto foi inicialmente positivo e Napoleão passou a dominar quase toda a
Europa Ocidental. Porém, a partir de 1810 a política
expansionista da França passou a provocar grande insatisfação tanto nos países dominados
e que sofriam com a crise econômica acentuada pelo bloqueio, quanto por parte
da população francesa que lamentava os excessivos gastos com o exército. Como
muitos países tinham uma economia basicamente agrícola e dependiam muito dos
produtos industrializados dos ingleses, não demorou para que o bloqueio fosse
desrespeitado. [5]
Os exemplos de Portugal e Rússia são, normalmente, os mais citados.
Em dezembro de 1807, Portugal, antigo aliado
da Inglaterra, voltou a comercializar com os ingleses e foi facilmente ocupado
e invadido. [6] Já o
governo russo, em dezembro de 1810, por ser um país essencialmente agrícola foi
forçado a desrespeitar o bloqueio. A resposta de Napoleão veio em 1812. Com um
exército contando com cerca de 600 mil soldados os franceses iniciaram a marcha
em direção a Moscou. Enquanto o poderoso exército francês avançava sem muitas
dificuldades, os russos recuavam ateando fogo às plantações e acabando com tudo
que pudesse ser útil aos invasores, atraindo, na verdade, as tropas francesas
para uma perigosa armadilha. Em outubro de 1812, vencidos pela fome, pelo
rigoroso inverno russo, por inúmeras doenças e pelos ataques de guerrilha
promovidos pelos russos, os franceses bateram em desesperada retirada. Estimasse
que dos 600 mil soldados, somente 10% sobreviveram e conseguiram retornar a
Paris.
A derrota na Rússia foi desastrosa para Napoleão. O fracasso militar do até então temível e imbatível exército francês estimulou outros exércitos da Europa a reagirem contra o domínio francês no continente. Uma grande coligação militar, composta por Inglaterra, Prússia, Rússia e pelo Império Austríaco, aproveitou-se do momento delicado vivido pelos franceses e invadiu Paris no dia 06 de abril de 1814. Sem apoio político, Napoleão renunciou à coroa imperial e foi enviado para a Ilha de Elba, no mar Mediterrâneo.[7] A coligação vitoriosa pôs no trono da França Luís XVIII, irmão do rei Luís XVI condenado à guilhotina em 1793.
A derrota na Rússia foi desastrosa para Napoleão. O fracasso militar do até então temível e imbatível exército francês estimulou outros exércitos da Europa a reagirem contra o domínio francês no continente. Uma grande coligação militar, composta por Inglaterra, Prússia, Rússia e pelo Império Austríaco, aproveitou-se do momento delicado vivido pelos franceses e invadiu Paris no dia 06 de abril de 1814. Sem apoio político, Napoleão renunciou à coroa imperial e foi enviado para a Ilha de Elba, no mar Mediterrâneo.[7] A coligação vitoriosa pôs no trono da França Luís XVIII, irmão do rei Luís XVI condenado à guilhotina em 1793.
GOVERNO DOS CEM DIAS
Em março de 1815 Napoleão fugiu da Ilha de Elba e desembarcou na França
com cerca de 1200 soldados prometendo reformas democráticas. Assim que a notícia se espalhou, Luís XVIII
enviou as tropas para prendê-lo. Entretanto, a popularidade de Napoleão ainda
era grande entre os franceses que o receberam como herói. Muitos dos soldados
do exército, seus ex-comandados, descumpriram as ordens do rei e passaram a
apoiar o antigo imperador que marchou em direção a Paris enquanto que Luis
XVIII e sua família fugiam para a Bélgica.
Ao retomar o governo da França, no qual permaneceu por pouco mais de
três meses, Napoleão tratou de recuperar o exército e tentou um ataque decisivo
contra os países que o haviam derrubado. Porém, a coligação militar
internacional foi novamente organizada e as tropas napoleônicas foram
derrotadas definitivamente em 18 de junho de 1815 na Batalha de Waterloo, na Bélgica.
Congresso de Viena
Após a definitiva derrota de Napoleão, que ao longo dos anos modificou
a Europa geograficamente e politicamente, os governantes dos países vencedores
reuniram-se em Viena, na Áustria, tendo como principal objetivo restabelecer o
equilíbrio político no continente europeu. As principais decisões tomadas no
Congresso de Viena foram:
Restauração e legitimidade: a situação
política anterior a revolução na França seria retomada e seriam considerados
legítimos os governos e as fronteiras que vigoravam antes de 1792.
Santa Aliança: algumas monarquias da Europa se
uniram com o propósito de impedir o avanço dos ideais liberais lançados durante
a Revolução Francesa, evitando assim que outras revoluções eclodissem na Europa
e nas colônias. Para atingir esses objetivos, as mais importantes monarquias
europeias criaram a Santa Aliança, que, além de intervir em países que
estivessem ameaçados por revoluções liberais, reprimiria todos os movimentos de
independência na América.
VÍDEOS:
Construindo um Império: Napoleão
Sob o domínio de Napoleão: Parte 1
Sob o domínio de Napoleão: Parte 2
Questões
1) Napoleão comandou a França de 1799 a 1815 e esse período
costuma ser dividido em três fases. Que fases são essas?
2) Com suas palavras, explique por que Napoleão alcançou
tanta popularidade no início de seu governo.
3) Cite algumas das medidas tomadas por Napoleão durante o
período do consulado.
4) O que foi o Código Civil Napoleônico? O que estava
estabelecido nesse código?
5) Napoleão recuperou rapidamente a economia da França. Qual
das medidas que ele tomou foi fundamental para essa recuperação? Justifique sua
resposta.
6) Explique o que foi o Bloqueio Continental e diga que
objetivo tinha Napoleão ao decretá-lo.
7) Napoleão formou um exército muito poderoso, praticamente
imbatível e com ele dominou quase toda a Europa. Mesmo assim, esse exército não
foi capaz de vencer a Inglaterra e foi derrotado pelos russos. Explique porque
isso ocorreu.
8) O que foi e que objetivos tinha o Congresso de Viena?
9) Com que finalidade foi criada a Santa Aliança?
[1] Como cônsul vitalício Napoleão tinha
a garantia de não ser afastado do cargo. Ou seja, seria cônsul por toda a vida.
[2] Na prática, muitos estudiosos afirmam que a
proclamação de Napoleão como cônsul vitalício em 1802 já significava o retorno
de uma monarquia hereditária.
[3] A coroação de Napoleão se deu com uma grande
celebração na Catedral de Notre Dame, em Paris. O papa Pio VII foi o
responsável pela cerimônia. Entretanto, no momento em que levava a coroa a
cabeça de Napoleão foi surpreendido com um gesto inesperado: Napoleão retirou
de suas mãos a coroa para em seguida ele
próprio se coroar, deixando claro que não aceitava autoridade alguma que
estivesse acima dele.
[4] A primeira coligação reuniu tropas da Inglaterra,
Áustria, Prússia e Rússia, países governados por monarcas que temiam ser
derrubados por movimentos revolucionários semelhantes aos que provocaram a
execução de Luís XVI.
[5] Na medida em que vários países descumpriam o decreto
imposto por Napoleão, as tropas francesas perdiam sua grande mobilidade e poder
de força. Em
pouco tempo, o exército francês teve que se dividir diante de várias frentes
militares que eram abertas.
[6] A invasão de Portugal pelas tropas napoleônicas teve
grande significado para a História do Brasil, como veremos melhor no próximo
capítulo. No final de 1807, diante da eminente invasão do território pelas
tropas napoleônicas, o rei de Portugal, D. João VI decidiu partir para o
Brasil. A chegada da família real portuguesa a América, no início de 1808,
significou mudanças irreversíveis. Para muitos, os quatorze anos em que D. João
e a toda a corte portuguesa esteve instalada na colônia foi fundamental para a
declaração da independência em setembro de 1822.
[7] Napoleão assinou o Tratado
de Fontainebleau, o qual determinava que fosse levado para a Ilha de Elba e
que receberia uma pensão anual de dois milhões de francos. Na ilha, Napoleão
não era propriamente um prisioneiro, porém, não poderia deixá-la.
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