"O passado não reconhece seu lugar: está sempre presente (Mário Quintana)

8.6 - A independência do Brasil e o Primeiro Império (1822 - 1831)

Portugal explorava ao máximo as riquezas existentes no Brasil. A partir do século XVIII essa exploração provocou o descontentamento das elites coloniais e o início de diversas rebeliões contra a metrópole. Algumas dessas rebeliões, como a Conjuração Mineira de 1789 e a Conjuração Baiana de 1798, por exemplo, tinham como objetivo separar o Brasil de Portugal e estabelecer assim a independência.
Muitos desses movimentos eram inspirados nos ideais de liberdade e igualdade da Revolução Francesa e no exemplo da Independência dos Estados Unidos, em 1776. Expomos isso para destacar que a ideia de independência, declarada em 1822, não era nova no Brasil. Além disso, devemos lembrar que a as mudanças promovidas por D. João no Brasil a partir de 1808 e foram decisivas e abriram caminho para a separação política entre Brasil e Portugal.  A luta pela independência do Brasil foi iniciativa dos grandes proprietários de terra e comerciantes, que, interessados em garantir especialmente a liberdade de comércio, se aproximaram politicamente de D. Pedro a articularam o processo a separação.

Antecedentes da declaração de independência:

O Brasil viveu dias agitados entre o retorno de D. João VI para Portugal e o famoso grito de Independência ou morte de 07 de setembro de 1822.  A figura central nos importantes acontecimentos que antecedem a declaração de independência foi o próprio príncipe Pedro de Alcântara, que, com importantes decisões, foi determinando o fim do domínio português e a conquista da autonomia política. Forçado pelos acontecimentos em Portugal e pelas exigências feitas pelos revolucionários na cidade do Porto, D. João VI voltou para a Europa em abril de 1821. Entre a elite econômica brasileira, formada por grandes proprietários e comerciantes, havia o medo da recolonização e do reestabelecimento do pacto colonial. Na verdade é o que pretendiam os portugueses que passaram a exigir também o retorno imediato de Pedro para Portugal.  
Diferentes grupos se organizaram diante da possibilidade de D. Pedro deixar o Brasil. Portugueses, que não desejavam a independência, exigiam a volta de Pedro para Portugal. Por outro lado, a ameaça feita pelos portugueses despertou a elite econômica brasileira para o risco de perder as vantagens obtidas durante o governo de D. João. Grandes comerciantes e fazendeiros aproximaram-se do príncipe tentando convencê-lo a permanecer no Brasil e preservar as conquistas.
No dia 09 de janeiro de 1822, já visto pela elite brasileira como líder da independência, Pedro decidiu permanecer no Brasil e proferiu a famosa frase: “Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto: diga ao povo que fico”. Nesse episódio, que ficou conhecido como dia do fico, Pedro deixou claro qual era seu posicionamento político agravando ainda mais sua relação com as autoridades portuguesas.  Em maio de 1822 o príncipe regente determinou que qualquer decreto vindo de Portugal só seria cumprido mediante o “cumpra-se” assinado por ele. Em outras palavras, a lei imposta pelo governo português só teria validade no Brasil se Pedro aceitasse. Essa determinação já garantia certa autonomia ao Brasil.
Em junho, mostrando visivelmente sua pretensão de garantir a independência, o príncipe regente convocou uma Assembleia Constituinte que teria o compromisso de elaborar um conjunto de leis para o Brasil. Ao mesmo tempo as tropas portuguesas passaram a ser consideradas inimigas.  A separação política entre Brasil e Portugal estava cada dia mais próxima. Para acalmar os ânimos da população que estava exaltada em várias regiões devido aos últimos acontecimentos, o príncipe fez uma rápida viagem para Minas Gerais e para São Paulo. Em agosto de 1822, insatisfeitos com os rumos dos acontecimentos no Brasil, os portugueses passaram a exigir a anulação das decisões tomadas por D. Pedro e ameaçaram enviar tropas para o Brasil com o objetivo de forçar o retorno do príncipe para Portugal.
 As ameaças feitas pelos portugueses tiveram grande repercussão. A própria Maria Leopoldina, esposa de D. Pedro, teria alertado sobre a intenção de Portugal recolonizar o Brasil por meio de uma carta que teria enviado ao marido e na qual dizia: “(…) Com o vosso apoio ou sem o vosso apoio ele (Brasil) fará a sua separação. [1] O ministro José Bonifácio[2] enviou um oficial de sua confiança ao encontro de D. Pedro que ainda estava em São Paulo iniciando viagem de volta ao Rio de Janeiro.

Ao tomar conhecimento da gravidade da situação Pedro de Alcântara tomou a decisão de declarar a separação política entre Brasil e Portugal.  O fato ocorreu no dia 07 de setembro de 1822 em São Paulo. A declaração de independência é repleta de curiosidades. Uma delas é que o célebre grito de independência proferido por Pedro não teria ocorrido às margens do riacho do Ipiranga, como sugere a própria letra do hino nacional, mas sim, no alto da colina próxima ao riacho, onde sua tropa esperava que ele se aliviasse de um súbito mal-estar intestinal. 


  D. Pedro foi aclamado imperador no dia 1º de dezembro de 1822, passando a se chamar D. Pedro I.  Apesar da declaração de independência, demoraria ainda um bom tempo para o Brasil tornar-se um país soberano, como conhecemos hoje.  A plena consolidação política do novo país deu-se nos anos seguintes e foi o próprio D. Pedro que se encarregou de conduzir a construção inicial do país.  

O QUE REALMENTE MUDOU NO BRASIL APÓS A INDEPENDÊNCIA?

Foi preciso algumas semanas para que grito de Independência ou Morte chegasse em todas as regiões do país e mais ainda em Portugal. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o rompimento político com os portugueses ficou conhecido em 04 de outubro enquanto que em Lisboa somente em novembro. As mudanças políticas, econômicas e sociais foram ainda mais lentas e em muitos aspectos nem aconteceram.
O processo de emancipação do Brasil não foi tão violento como o enfrentado pelos demais países do continente que se separavam da Espanha, mas também não veio de um acordo entre D. João VI e D. Pedro I e, sendo assim, em nenhum momento foi pacífico como por algum tempo sugeriram alguns historiadores. Enquanto que em algumas regiões as celebrações duraram dias, em outras foi organizada forte resistência. Entre 1823 e 1824, na chamada Guerra de Independência, especialmente nas províncias do Grão-Pará, Maranhão, Piauí e Bahia muitos brasileiros e portugueses morreram defendendo a separação entre Brasil e Portugal ou tentando evita-la.  
A independência do Brasil foi conduzida pela elite econômica, ou seja, grandes proprietários de terra e comerciantes e não contou, portanto, com a participação de setores das classes mais populares. Significa dizer que a maioria absoluta da população desconheceu ou pouco acompanhou os vários acontecimentos que agitavam o Brasil naqueles dias. Apesar de o Brasil poder estabelecer suas próprias normas e sua própria administração, a independência não resultou em profundas transformações econômicas ou sociais. Ou seja, para milhares de trabalhadores livres ou escravizados, urbanos ou rurais a vida em nada ou em quase nada se modificou. 
Os grandes proprietários de terra continuaram dominando a economia que continuaria sendo essencialmente agrária exportadora e dependente da mão de obra escrava. A escravidão ainda foi mantida por décadas e no plano político foi garantida a estabilidade da camada dominante. As decisões políticas ficariam restritas aos ricos. Diferente dos outros países da América que se libertaram da Espanha e que adotaram a república como forma de governo, o Brasil adotou a monarquia. Além disso, foi o único país que mesmo após declarar-se independente passou a ser governado por um membro da família real de sua ex-metrópole. 
Além de assegurar a integridade territorial do país enfrentando a resistência de algumas províncias das regiões Norte e Nordeste que não aceitavam a independência, D. Pedro tratou de no plano externo garantir o reconhecimento da soberania do Brasil por parte de outros países. O Primeiro Império, que vai de 1822 a 1831, caracterizou-se dessa forma por ser um período de transição sendo marcado por forte crise econômica, social e política. Somente com a abdicação de D. Pedro I em 1831 é que o Brasil realmente pôde se afirmar como país independente.

A CONSOLIDAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA

Após o 7 de setembro de 1822 ocorreram várias manifestações de oposição a independência. Embora tenham ocorrido em várias regiões, as reações mais intensas ocorreram nas províncias do Grão-Pará, Maranhão, Piauí e Bahia, onde as elites locais estavam economicamente mais ligadas a Portuga, e no sul na província da Cisplatina (atual Uruguai)[3]. Especialmente no norte e nordeste a resistência era organizada por militares e importantes comerciantes portugueses que se recusavam a aceitar a separação política e a autoridade do imperador.
O efetivo militar do Brasil era reduzido logo após a independência.  A maior parte das tropas do exército e mesmo da marinha de guerra eram compostas por soldados portugueses. Ainda havia um número de brasileiros que, ligados às autoridades portuguesas, defendiam seus privilégios financeiros ou políticos sendo leais à Coroa. A maior resistência ocorreu na Bahia e Dom Pedro I precisou reagir rapidamente para não colocar em risco a recém conquistada liberdade. O ministro José Bonifácio adotou providências, comprando armas e navios, recrutando tropas nacionais e contratando mercenários estrangeiros, especialmente ingleses e franceses. [4]
A guerra para garantir internamente a consolidação da independência foi marcada por ameaças e por cercos às cidades em que os portugueses resistiram até se entregarem pela fome ou doenças. Apesar das dificuldades, as tropas enviadas por D. Pedro conseguiram vencer os rebeldes em 02 de julho de 1823. Além de um confronto naval próximo a Salvador, apenas as batalhas de Pirajá, na Bahia, e Jenipapo, no Piauí, movimentaram grandes exércitos.[5] Nos meses seguintes, mesmo tendo sufocado os focos de resistência, o governo teve que enfrentar a Confederação do Equador em 1824, quando províncias lideradas por Pernambuco se organizaram com o propósito de formarem uma república, e o desejo de liberdade da província da Cisplatina.

 Assembleia Nacional Constituinte

Ao mesmo tempo em que se preocupava com a consolidação da independência no plano interno, D. Pedro estava atento à elaboração do primeiro conjunto de leis para o país, elemento fundamental para a construção e organização do estado nacional brasileiro. Como vimos, essa preocupação foi manifestada por D. Pedro antes mesmo da declaração da independência quando convocou, em junho de 1822, uma Assembleia Constituinte. Para compor a Assembleia foram eleitos em cada uma das províncias, como passaram a se chamar as capitânias, cerca de 90 deputados que teriam o compromisso de elaborar a primeira constituição do novo país. Os deputados se reuniram no Rio de Janeiro no dia 03 de maio de 1823 e estavam divididos em dois grupos políticos: o partido brasileiro, que defendia a limitação dos poderes de D. Pedro I e não queria a participação de estrangeiros na vida política brasileira, e o partido português, que, contando com a participação de militares e comerciantes portugueses, defendia o absolutismo para o imperador, ou seja, poderes totais.
Apesar de defenderem projetos políticos diferentes, a maioria dos membros da Assembleia Constituinte representavam e defendiam os interesses dos grandes proprietários rurais, que apoiaram e dirigiram o processo de independência.  Sendo assim, qualquer que fosse o projeto aprovado, ele atenderia aos interesses da elite. Os debates entre os dois partidos resultaram em um projeto em que prevaleciam as ideias defendidas pelos deputados do partido brasileiro, em maioria na Assembleia. 
O projeto de constituição elaborado pelos deputados estabeleceria a divisão dos poderes, seria marcado pela firme oposição aos portugueses e limitaria os poderes do imperador. Entre os principais pontos da constituição que estava sendo elaborada, destacam-se:
- estrangeiros seriam afastados da vida política e pública. Os portugueses, que ainda podiam ameaçar a independência do Brasil e até mesmo articular a recolonização, estavam proibidos de ocupar cargos públicos de representação nacional (deputado, senador). Alguns deputados mais radicais ainda defendiam a expulsão de militares estrangeiros do país.

- O poder seria dividido em três: executivo, legislativo e judiciário. O poder do legislativo seria ampliado e o poder do imperador seria limitado.  Somente a Assembleia poderia elaborar ou alterar leis, D. Pedro teria que governar respeitando a constituição e as forças armadas deveriam obedecer as ordens do Legislativo e não do imperador. 

- O projeto atendia aos interesses dos grandes proprietários, portanto, mantinha a escravidão e restringia a eles o poder político. Foi adotado o voto censitário para as eleições, ou seja, eleitores e candidatos teriam que comprovar rendas elevadas, avaliadas segundo a quantidade de terras e escravos.
    
D. Pedro I se recusou a aceitar o projeto de constituição que limitava seus poderes e  no dia 12 de novembro de 1823 ordenou o cerco e o fechamento da Assembleia Nacional. Houve reação dos deputados do partido brasileiro que interpretaram a atitude do imperador como sendo o primeiro passo para a recolonização do Brasil. Alguns deputados foram presos e expulsos do país, como José Bonifácio e seus irmãos Antônio Carlos e Martim Francisco. O exílio durou de 1823 a 1829.
O imperador era apoiado pelo Partido Português e desejava assumir o comando do país tendo poderes absolutos. O episódio do fechamento da Assembleia ficou conhecido como a “Noite da Agonia” e é considerado o primeiro ato de autoritarismo de D. Pedro.  Após dissolver a Assembleia, D. Pedro nomeou um grupo de dez pessoas de sua confiança para elaborar uma constituição que atendesse a seus interesses.

A primeira constituição do Brasil

No dia 25 de março de 1824 finalmente a constituição foi finalizada e anunciada ao povo. Em linhas gerais, garantia plenos poderes ao imperador e garantia as vantagens políticas aos grandes proprietários de terra, responsáveis diretos pela independência.
Além dos poderes executivo, exercido pelo imperador que recebia a ajuda de ministros indicados por ele, do legislativo, formado por senadores e deputados [6], e do judiciário, a constituição estabelecia um quarto poder, o poder moderador, exercido exclusivamente pelo imperador e que permitia interferência em todos os outros poderes. Por esse quarto poder, o imperador tinha o direito de ter a última palavra sobre qualquer decisão administrativa tanto no governo central como nas províncias. Na prática, o poder moderador garantia poderes absolutos ao imperador que tinha, inclusive, o direito de não responder na justiça por seus atos. Além disso, a constituição estabelecia como forma de governo uma monarquia hereditária constitucional e representativa. As províncias seriam administradas por presidentes escolhidos pelo imperador.
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Em relação às eleições, só poderiam votar homens, alfabetizados, acima de 25 anos e que declarassem uma renda mínima de 100 mil-réis por ano.[7] Só poderiam ser eleitos para cargos de deputados homens com renda mínima de 400 mil-réis anuais e só poderiam ser indicados para ocupar o cargo de senador aqueles que apresentassem uma renda anual  de pelo menos 800 mil-réis. Praticamente só os grandes proprietários satisfaziam essas condições. Apesar de garantir os direitos individuais e a liberdade de imprensa e opinião, escravos, indígenas, analfabetos, mulheres, menores de 25 anos e pobres eram totalmente excluídos de direitos políticos. Com essas regras, as classes dominantes garantiam a manutenção de seus privilégios. Ricos elegiam ricos que, por sua vez, governavam para ricos.
A constituição manteve o catolicismo como religião oficial do Brasil e também o regime do padroado,[8] pelo qual o próprio imperador organizava a Igreja Católica podendo dar ordem de construir igrejas e até nomear padres e bispos. Esses religiosos eram considerados funcionários públicos. Ainda no aspecto religioso, a constituição garantiu pela primeira vez no Brasil liberdade de culto, ou seja, adeptos de outras crenças que não fosse a católica poderia livremente professar a sua fé.

        Confederação do Equador, 1824

O autoritarismo de D. Pedro I manifestado claramente no fechamento da Assembleia Constituinte em 1823 e na imposição de uma constituição que lhe garantia plenos poderes através do pode moderador, foi condenado por grupos de várias províncias.  O principal caso ocorreu na região nordeste do Brasil onde o descontentamento com o autoritarismo do governo, somado a sérias dificuldades econômicas e aumento das cargas tributárias impostas pelo governo provocaram o início de um movimento contra a monarquia e o surgimento de um projeto separatista.
Ricos proprietários, insatisfeitos com a queda das exportações de açúcar, pequenos comerciantes, mestiços, negros livres e escravos que levavam uma vida precária, uniram-se com o objetivo de instalar um regime republicano de caráter liberal e que desse maior autonomia para as províncias. A revolta teve início em Pernambuco quando D. Pedro resolveu substituir o presidente da província, Pais de Andrade, por um homem de sua confiança. De Pernambuco o movimento se espalhou para outras províncias. Além de Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba e Ceará criaram em julho de 1824 a Confederação do Equador, uma república separada do resto do país. Entre os principais líderes do movimento estavam Frei Caneca e Cipriano Barata.
Após instalarem um governo provisório os revolucionários acabaram se desentendendo. A elite envolvida decidiu se afastar do movimento quando os setores populares passaram a defender medidas que pretendiam acabar com a escravidão e ampliar os direitos sociais.
Por outro lado, D. Pedro contratou mercenários que vieram da Inglaterra para reforçar as forças do governo que enfrentariam os revoltosos no nordeste. A Confederação do Equador teve seu fim e vários envolvidos foram acusados e executados. Entre eles, Frei Caneca teve como pena a morte por fuzilamento.

    O RECONHECIMENTO DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL
O famoso e celebrado Grito do Ipiranga foi seguido de muito trabalho de D. Pedro para assegurar a autonomia política da nação brasileira. Controladas as províncias do Norte e Nordeste que não aceitavam a separação entre Brasil e Portugal e anunciado o conjunto de leis, o imperador teve que garantir que importantes nações reconhecessem a soberania do novo país para que assim o Brasil realmente pudesse se estabelecer como um Estado livre.
Na Europa, muitos países não eram favoráveis a independência de qualquer ex-colônia e defendiam a manutenção do absolutismo e do sistema colonial. Mesmo na América, os países que recentemente haviam se libertado da Espanha adotando a República como forma de governo, desconfiavam da Monarquia adotada pelos brasileiros por acreditarem que potências europeias poderiam usar o Brasil para recolonizar o continente.
Contrário à presença europeia na América, em 1824 os Estados Unidos foi o primeiro país a reconhecer a independência do Brasil. Através de seu presidente, James Monroe, e com o lema “América para os americanos”, o governo norte-americano tinha um claro interesse em ser ele o “protetor” dos promissores mercados sul-americanos. Apesar da importância da manifestação dos Estados Unidos, o Brasil teria que fazer com que Portugal, sua antiga metrópole, reconhecesse sua liberdade política.  
Em agosto de 1825, por intermédio do governo inglês, Portugal assinou o Tratado de Paz e Aliança reconhecendo independência brasileira.  Em troca os portugueses exigiram do governo brasileiro uma indenização de dois milhões de libras esterlinas. Como não dispunha do valor para pagar a pesada indenização, o Brasil obteve um empréstimo junto à Inglaterra, iniciando assim a dívida e dependência econômica em relação aos ingleses. Na verdade, o dinheiro nem chegou a sair da própria Inglaterra, já que os portugueses tinham que pagar uma dívida equivalente aos mesmos credores. Após o reconhecimento por parte de Portugal, outros países da Europa e da América também reconheceram a independência brasileira. Com isso o Brasil poderia estabelecer relações diplomáticas e assinar tratados de comércio com outras nações do mundo.
Nesse momento, garantir o reconhecimento da Inglaterra, principal potência industrial e econômica da época, era de grande importância para o Brasil. Em troca os ingleses exigiram que os tratados de comércio assinados em 1810 - e vencidos em 1825 - fossem renovados por mais quinze anos. Como vimos, esses tratados facilitavam a entrada de produtos industrializados ingleses no Brasil e prejudicavam muito a indústria brasileira. Em 1827 foi assinado o Tratado de Aliança, Comércio e Amizade e a economia brasileira continuou sofrendo por muito tempo com a concorrência inglesa. A Inglaterra ainda pressionava para que o tráfico de escravos fosse abolido até o ano de 1830, porém, nesse ponto os ingleses não tiveram sucesso. 

Guerra da Cisplatina (1825 – 1828)
    
Ao mesmo tempo em que se preocupava com a manutenção do território na região nordeste, D. Pedro I teve que enfrentar, ao sul, a revolta da província da Cisplatina. A região, de grande importância estratégica e historicamente colonizada pela Espanha, havia sido invadida por tropas portuguesas em 1816 e incorporada ao império português na América pelo rei D. João VI, no ano de 1820. Apesar de aprovação em Congresso, domínio português sobre a região nunca foi plenamente aceito pela população da região, e especialmente a partir do retorno de D. João VI e declaração de independência do Brasil em setembro de 1822, teve início na Cisplatina o movimento revolucionário que desejava a liberdade.[9] Além de se sentirem prejudicados política e economicamente, os cisplatinos alegavam que era um absurdo a província permanecer unida ao Brasil pelo fato de os laços históricos e culturais serem totalmente distintos em comparação ao restante do país. Apesar do forte argumento, D. Pedro não aceitou perder o domínio sobre a Cisplatina.
Em 1825, recebendo apoio financeiro e militar da Argentina[10] e liderados pelo general Lavalleja, os cisplatinos se organizaram para lutar contra o domínio brasileiro e conquistar a independência. A chamada Guerra da Cisplatina se estendeu de por três anos provocando grandes prejuízos aos envolvidos. França e especialmente Inglaterra, países que tinham interesses comerciais na região passaram atuar para estabelecer a paz. Em 1828 os ingleses apresentaram uma proposta que foi aceita pelos governos de Brasil e Argentina que reconheceram a independência da Cisplatina que passou a se chamar República Oriental do Uruguai. Além da perda de muitas vidas, a guerra agravou os problemas financeiros do Brasil e a derrota aumentou a impopularidade de D. Pedro I. Além disso, o Uruguai tornou-se um importante concorrente para o charque produzido no Rio Grande do Sul sendo uma das causas para a famosa Guerra do Farrapos.

 A crise do Império e a abdicação de D. Pedro I
D. Pedro I assumiu o posto de imperador para atender aos interesses da elite que temia perder as liberdades políticas e econômicas alcançadas durante o governo de D. João VI. Portanto, a base do apoio político do governo estava entre os comerciantes e grandes proprietários de terra do período. Entretanto, a postura centralizadora de D. Pedro, suas atitudes de caráter autoritário e a crescente crise financeira vão provocar o descontentamento das elites que sustentavam o poder do imperador.
A queda da popularidade de D. Pedro teve início ainda em 1823 quando ordenou dissolução da Assembleia Nacional e escolheu um pequeno grupo de aliados para elaborarem a primeira constituição do Brasil. O gesto de autoritarismo foi mal visto pelos políticos brasileiros e a situação agravou-se quando em 1824 a carta constitucional previa a existência de um quarto poder, denominado poder moderador e que pelo qual o rei poderia anular qualquer decisão tomada pelo legislativo e executivo. Grande parte dos representantes políticos da época, ligados essencialmente aos interesses das elites, fizeram duras críticas ao excessivo poder adquirido pelo imperador. A violência utilizada para controlar os rebeldes da Confederação do Equador também foi motivo para críticas.
A morte de D. João VI no ano de 1826 fez de D. Pedro legítimo herdeiro do trono de Portugal.[11] A situação preocupou os brasileiros que não queriam que D. Pedro fosse ao mesmo tempo imperador do Brasil e rei de Portugal. Não demorou para o imperador ser acusado de estar mais preocupado com as sucessão do trono português do que com os problemas brasileiros.
Além das questões de ordem política, os problemas financeiros também tiveram grande peso para o aumento da insatisfação com o governo. As dívidas com a Inglaterra, os gastos elevados com a Guerra da Cisplatina e a falência do Banco do Brasil em 1829 estão entre as principais razões para a crise econômica. Em novembro de 1830, quando já era nítido o enfraquecimento político de D. Pedro, um escândalo piorou ainda mais a sua imagem. O jornalista Líbero Badaró, conhecido por fazer forte oposição ao governo, foi assassinado. Embora as investigações tenham sido imprecisas e os criminosos não tenham sido encontrados, as suspeitas caíram sobre pessoas ligadas ao imperador. 
No início de 1931 ocorriam no Rio de Janeiro vários confrontos entre brasileiros e portugueses. Em março ocorreu o episódio conhecido como Noite das Garrafadas, quando políticos contrários ao imperador se confrontaram nas ruas do Rio de Janeiro com portugueses que organizavam uma festa de recepção a D. Pedro I que retornava de Minas Gerais. O imperador ainda tentou recuperar seu prestígio anunciando um grupo de ministros formado somente por brasileiros, porém, era tarde demais. No dia 07 de abril de 1831, sem apoio político, abandonado pelos militares e muito criticado pela opinião pública, D. Pedro I abdicou o trono em favor de seu filho, Pedro de Alcântara, então com 5 anos de idade, iniciando assim no Brasil o Período Regencial. [12]

Questões:
1) Algumas regiões do Brasil se negaram a aceitar a separação política entre Brasil e Portugal declarada por D. Pedro I em 07 de setembro de 1822. Que regiões foram essas e que motivos tinham para não aceitar a separação?
2) Que grupos sociais lideraram o processo de independência do Brasil e que objetivos tinham? O que mudou ou permaneceu igual no Brasil após a independência?
3) Após declarar a independência do Brasil D. Pedro convocou a Assembleia Constituinte para elaborar a primeira constituição do Brasil. Sobre esse momento, responda:
a) A que grupo social pertenciam os deputados que formaram a assembleia?
b) Quais eram os principais pontos da constituição que estava sendo elaborada?
c) Por que razões D. Pedro ordenou o fechamento da Assembleia e de que modo esse gesto foi interpretado pelos políticos brasileiros?
4) A primeira constituição do Brasil foi apresentada ao povo no dia 25 de março de 1824.
a) Diga quais foram os principais pontos da constituição e explique de que maneira ela dava plenos poderes ao imperador.
b) Pela constituição, quais eram os critérios que definiam quem poderia votar e ser votado?
5) Com relação à Confederação do Equador, responda:
a) Quais eram os principais líderes do movimento? Quais foram as principais críticas feitas por eles?
b) O que provocou a revolta e que grupos sociais estavam envolvidos?
c) Por que os grandes proprietários de terra deixaram de apoiar o movimento?
6) O que foi, quando ocorreu e como terminou a Guerra da Cisplatina?
7) Após controlar as províncias que não aceitavam a separação política entre Brasil e Portugal, D. Pedro tratou de obter o reconhecimento por parte de outros países. Sobre isso, responda:
a) Qual foi a exigência feita por Portugal para reconhecer o Brasil como nação independente? 
b) De que maneira o governo brasileiro teve a independência reconhecida pela Inglaterra? O que esse reconhecimento representou para a economia brasileira?
8) Com suas palavras, explique os motivos que provocaram a crise do I Império e a  queda da popularidade de D. Pedro I. 
9) Por que razões D. Pedro I decidiu abdicar o trono do Brasil em abril de 1831? Quem assumiria o poder em seu lugar? Que período da história brasileira teve início nesse momento?






[1] Segundo alguns pesquisadores, D. Pedro estaria na casa de sua amante, a Marquesa de Santos, quando recebeu a carta de sua esposa.
[2] Conhecido como o “Patriarca da Independência”, José Bonifácio foi ministro do príncipe D. Pedro, tornando-se figura importante no processo de Independência do Brasil). Orientou e aconselhou D. Pedro nos momentos que antecederam a declaração de independência.

[3] Como vimos no módulo anterior, durante o período de permanência da Corte portuguesa no Rio de Janeiro, várias foram as campanhas luso-brasileiras na região do Rio da Prata. Em julho de 1821, o território do atual Uruguai foi anexado ao "Reino Unido do Brasil, Portugal e Algarve". A região foi batizada de "Província Cisplatina", que significa "aquém do Rio da Prata".
[4] As tropas brasileiras foram comandadas por militares estrangeiros como, por exemplo, os britânicos Lord Cochrane e John Taylor, além do francês Pierre Labatut.
[5] As estatísticas não são precisas em relação ao número de mortes em combate. Registros oficiais da época estimam  que a guerra de independência no Brasil tenha provocado 2000 e 3000 mortos.
[6] Os senadores eram indicados pelo imperador e o cargo era vitalício, ou seja, durava até o fim da vida. Já os deputados eram eleitos para cumprir por um período determinado. Deputados e senadores seriam os responsáveis pela elaboração das leis do país.
[7] Era o chamado Voto censitário, ou seja, para poder votar e se candidatar a pessoa deveria comprovar determinada renda.
[8] O Padroado foi criado através de um tratado entre a Igreja Católica e os Reinos de Portugal e de Espanha. A Igreja delegava aos monarcas destes reinos ibéricos a administração e organização da Igreja Católica em seus domínios fora da Europa. Assim, a estrutura do Reino de Portugal e de Espanha tinha não só uma dimensão político-administrativa, mas também religiosa.

[9] Em abril de 1821 pouco antes de D. João VI retornar para Portugal, foi realizado o  Congresso Cisplatino com o objetivo de decidir se a Banda Oriental permaneceria anexada ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve, se tornaria um país independente ou ainda se acabaria como parte de um outro governo.
[10] Desde a independência da Argentina, por meio da chamada Revolução de Maio de 1810, Buenos Aires desejava anexar a Cisplatina as Províncias Unidas do Prata, como eram chamadas as antigas províncias do Vice-reinado espanhol na região.
[11] D.Pedro I renunciou o trono de Portugal em nome de sua filha, Maria da Glória.  Como era menor de Idade, D. Miguel, irmão  de D. Pedro e noivo de Maria da Glória,  ficou com o trono como regente  e acabou traindo  o  irmão expulsando a sobrinha do trono e tornando-se rei de Portugal.
[12] Em 1831, após a abdicação, D. Pedro I nomeou José Bonifácio como tutor de seus filhos. Porém, em 1833, foi demitido desta função. 
Referências bibliográficas:

BORIS, Fausto. História concisa do Brasil. – 2ª ed., 5ª reimpr. – São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2012.

CALÓGERAS, J. Pandiá. A política exterior do Império. Edição fac-similar. Brasília: Senado Federal, 1998.

CARNEIRO, David. História da Guerra Cisplatina. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1946.

CARVALHO, Carlos Delgado de. História diplomática do Brasil. Coleção Memória Brasileira, v. 13. Brasília: Edição fac-similar. Senado Federal, 1998.

CARVALHO, José Murilo de. O Brasil da independência até metade do século XIX. In: BETHELL, Leslie (org.) História da América Latina: da Independência até 1870. v. III. São Paulo: EDUSP; Imprensa Oficial do Estado; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2001.

FERREIRA, Fábio. A Presença Luso-Brasileira na Região do Rio da Prata: 1808 – 1822. In: Revista Tema Livre, ed.03. Disponível em: http://www.revistatemalivre.com

GOMES, Laurentino. 1822: como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram o D. Pedro a criar o Brasil, um país que tinha tudo para dar errado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010.

HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil monárquico, tomo II: o processo de emancipação/ por Célia de Barros Barreto ... [et al.] 9ª ed. – Rio de Janeiro: Bertrand, 2003.

MAESTRI, Mario. Uma história do Rio Grande do Sul – O Império: da consolidação à crise do escravismo (1822 – 1889). Passo Fundo: Ed. Da Universidade de Passo Fundo, 2005.

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